O Estatuto da Criança e do Adolescente, ou ECA como é mais conhecido, está completando 30 anos este mês. O documento é um dos principais alicerces, senão o principal, do nosso trabalho, sobretudo devido às leis e diretrizes sobre adoção e Acolhimento Familiar. Foi em uma das reformulações do ECA, em 2009, que o Acolhimento Familiar foi elevado à grau preferencial em relação ao acolhimento institucional, para garantir o direito constitucional de toda criança e adolescente, em situação de vulnerabilidade, viver em família. Saiba aqui o que mudou e o que ainda precisamos avançar nos 30 anos do ECA.

O início

Instituído pela Lei 8.069 no dia 13 de julho de 1990, o ECA tem como base o artigo 227 da Constituição Federal de 1988, que estabelece que crianças e adolescentes possuem direitos específicos e, portanto, demandam proteção especial, com prioridade absoluta, do Estado, da sociedade e da família, garantindo seus direitos. Antes disso, os direitos para crianças e adultos eram tratados sem distinção. Outro documento extremamente importante e que também ajudou a definir as bases do Estatuto foi a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, definida pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989, e ratificada por 196 países, entre eles o Brasil, que estabeleceu que “a criança, para o pleno e harmonioso desenvolvimento de sua personalidade, deve crescer no seio da família, em ambiente de felicidade, amor e compreensão”.

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com ABSOLUTA PRIORIDADE, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

(Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 4)

 

A aprovação do ECA também resultou na criação dos Conselhos Tutelares, que não existiam antes de 1990. A medida ampliou significativamente a rede de proteção à infância, e hoje esses órgãos somam mais de 30 mil unidades, presentes na maioria dos municípios brasileiros, sendo essenciais no atendimento e auxílio de crianças, adolescentes e pais.

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Evolução ao longo dos anos

Questões importantes como proteção contra violência, abusos físicos, morais e sexuais e combate ao trabalho infantil constam no Estatuto, com diretrizes sobre como proceder para denunciar esses casos e as penalidades para aqueles que cometem tais atos. O ECA também dispõe, por exemplo, sobre a entrega legal de bebês recém-nascidos para adoção, sem que haja ocorrência de crime ou qualquer tipo de constrangimento para a mãe, num processo amparado por lei e com muito mais respeito pela vida.

A Lei 12.010 que alterou o ECA, tornou-se conhecida como Lei Nacional da Adoção, por disciplinar essa prática no Brasil. Aprovada em 3 de agosto de 2009, trouxe muitos avanços, com o objetivo de facilitar os processos de adoção. Um dos principais foi a criação de um cadastro nacional de pretendentes e de crianças e adolescentes aptos para adoção, para agilizar a adoção e impedir uma prática comum no país, a adoção direta, em que a pessoa já aparece com a criança pretendida. A nova lei criou ainda maior controle sobre os abrigos, chamados agora de acolhimento institucional ou casas de acolhimento. A Lei 12.010 também deixou claro que a permanência no acolhimento deve ser algo excepcional e temporário e que o Acolhimento Familiar é prioritário ao acolhimento institucional.

Em 8 de março de 2016, o ECA passou por uma nova reformulação, com a Lei 13.257, cujo destaque foi a criação do Marco Legal da Primeira Infância, um conjunto de ações voltadas à promoção do desenvolvimento infantil, desde a concepção até os seis anos de idade, colocando as crianças nessa faixa etária como prioridade no desenvolvimento de programas, na formação de profissionais e na formulação de políticas públicas, valorizando ainda mais os primeiros anos de vida, período conhecido como Primeira Infância e cientificamente comprovado como base de todo o desenvolvimento humano.

Nessa lei, o Acolhimento Familiar foi ainda mais reforçado, conforme disposto no artigo 34, por promover a convivência familiar e comunitária, tão necessária ao desenvolvimento na Primeira Infância:

“A União apoiará a implementação de serviços de acolhimento em família acolhedora como política pública.”

Para baixar o PDF com a história da adoção e do acolhimento no Brasil, clique aqui.

O ECA aplicado à realidade atual

É claro que ao longo dos seus 30 anos o ECA precisou se adaptar e evoluir junto com a sociedade. Assim, a rede de proteção foi ampliada também para o ambiente virtual. O artigo 241 do Estatuto, por exemplo, fala sobre os crimes em constranger ou instigar crianças e adolescentes para a prática de atos libidinosos através de qualquer meio de comunicação, incluindo a internet, uma prática que infelizmente recebemos constantemente notícias de novos casos e que deve ser punida com rigor.

Já em 2019, o ECA recebeu uma atualização onde consta a criação da “Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência”, sempre próxima do dia 1º de fevereiro, para reflexão e divulgação de medidas educativas sobre essa realidade, pois segundo dados do Ministério da Saúde cerca de 930 adolescentes e jovens dão à luz todos os dias no Brasil.

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Um dos anúncios das comemorações dos 30 anos do Estatuto foi a transferência de R$ 2,3 bilhões para auxiliar os estados e municípios na compra e distribuição da merenda escolar na rede pública de ensino, além de R$ 2,5  bilhões que serão repassados aos municípios para fortalecimento da rede do Sistema de Assistência Social (SUAS), que hoje conta com mais de 2 mil unidades de acolhimento e atende cerca de 34 mil crianças e adolescentes.

Nesse ano, em meio à pandemia do coronavírus, a UNICEF reforçou a importância dos avanços alcançados no Brasil graças ao ECA, como a redução da mortalidade infantil, com 827 mil vidas salvas entre 1996 e 2017, e o acesso à escola – em 1990, 20% das crianças entre 7 e 14 anos não tinham acesso à escola, sendo que em 2018 esse índice diminuiu para 4,2%. A redução do trabalho infantil também merece destaque, uma vez que entre 1992 e 2016 o país evitou que 6 milhões de meninas e meninos entre 5 e 17 anos estivessem nessa situação.

Mas precisamos melhorar

Apesar de todas essas mudanças, é preciso ressaltar que ainda assim os avanços não foram suficientes. Não por falta de leis – o ECA é considerado umas das leis mais avançadas na proteção da criança e do adolescente – e sim, pela sua não aplicabilidade.

Infelizmente, milhões de crianças e adolescentes brasileiros ainda não têm acesso completo aos seus direitos!

Milhões de crianças e adolescentes ainda vivem em situação de pobreza, muitos continuam fora da escola, mais de 2,4 milhões de menores sofrem com o trabalho infantil, e o acolhimento familiar que é prioridade ao acolhimento institucional desde 2009, ainda só responde por vergonhosos 4% das crianças e adolescentes acolhidos. Para acessar os dados atuais da adoção e do acolhimento familiar, segundo o SNA/CNJ, clique aqui.

A violência também está entre os problemas mais sérios, pois os homicídios de crianças e adolescentes mais do que dobraram nesses últimos 30 anos. Questões como o tratamento para menores infratores, por exemplo, priorizando a via pedagógica ao invés da punição, ainda são tratadas de forma precária.

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E o trabalho continua…

Entre as diversas mudanças trazidas nesses 30 anos do ECA está uma importante quebra de paradigma: uma nova maneira de enxergar e entender a criança e o adolescente como indivíduos únicos, dotados de personalidade e opinião próprias, respeitando sua forma de ver a vida, sua evolução, seus desejos e vontades, dando a eles todo o respeito e condição para seu desenvolvimento, inclusive intelectual.

Essa convivência extremamente benéfica com a família e a sociedade ocorre de forma mais fluída hoje, não somente devido à lei, mas também graças à evolução natural das relações humanas ao longo dos anos. Falando de forma ampla, o Estatuto mudou paradigmas e a forma como tratamos as questões relacionadas à proteção de crianças e adolescentes no Brasil. E mesmo 30 anos depois, num país com dimensões continentais e tamanha desigualdade social, sabemos que o trabalho está apenas começando!

*Com informações dos portais G1, R7, das Nações Unidas e do Ministério Público do Estado do Paraná

 

 

 

 

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