Com a chegada do inverno, a questão dos moradores de rua, realidade que ocorre com frequência nas grandes metrópoles brasileiras, fica ainda mais em evidência. E não podemos nos esquecer da grande quantidade de crianças e adolescentes negligenciados, que também vivem nas ruas de todo o Brasil.
Segundo informações do portal G1, um censo que vem, sendo realizado pela Prefeitura de São Paulo em maio de 2022, época em que escrevemos essa matéria, mostrou que a maior cidade em número de habitantes do Brasil conta com 526 pontos de concentração de crianças e adolescentes em situação de rua.
Em dois anos, houve um aumento de 30% no número de moradores de rua na cidade, que chega a quase 32 mil pessoas. E apesar de não termos o número exato de crianças e adolescentes dentro desse montante em 2022, fica evidente que a parcela deles que está sem um teto também aumentou. É quase impossível parar em um farol na região central da capital paulistana, por exemplo, sem que uma criança venha oferecer algum serviço, vender doces ou simplesmente pedir auxílio para si e para sua família.
As violações de direitos que essas crianças sofrem ficaram ainda mais evidentes após uma pesquisa realizada pela Associação Beneficente O Pequeno Nazareno e pelo Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância da PUC do Rio de Janeiro sobre crianças e adolescentes em situação de rua e em acolhimento institucional.
Com o objetivo de subsidiar políticas públicas que possam atender efetivamente essa parcela da população, a pesquisa foi realizada no começo da pandemia nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Brasília, Fortaleza, Belo Horizonte, Manaus, Curitiba, Recife, Porto Alegre, Belém, Goiânia, Guarulhos, Campinas, São Luís, São Gonçalo e Maceió.
A vulnerabilidade ficou evidente: a luta pela sobrevivência, o racismo estrutural, o trabalho infantil, a violência nas ruas e dentro da própria família e a baixa escolaridade, esta última agravada pelo contexto da pandemia, são alguns dos principais – e sérios – problemas encontrados.
85% das crianças e adolescentes que vivem em situação de rua são negros. Nas instituições de acolhimento esse número é ainda mais expressivo, chegando a 89% que se autodeclaram pretos ou pardos.
Além disso, a pesquisa mostrou que cerca de 60% dos menores que vivem nas ruas e 70% dos que estão acolhidos frequentam a escola, mas a pandemia tornou nula a frequência escolar presencial, e assim eles passaram mais tempo nas ruas, sem opções reais de lazer, sem ter onde brincar e sem condições de ocupar seu tempo de maneira saudável.
Como resultado, acaba ocorrendo, em muitos casos, a exploração do trabalho infantil, com as crianças sendo colocadas na “linha de frente” desde cedo, seja para pedir, seja para vender. Mas é óbvio que isso não é uma regra: nem toda mãe e pai em situação de rua coloca seus filhos nessa situação. Há quem sofra para criá-los da melhor maneira possível dentro dessa situação limite, em que alimentação e higiene, quando possível, são obtidos com esforço máximo. Lembrando que há gestantes e bebês em situação de rua também!
Outro estudo, realizado em 2019 pela ONG Visão Mundial, pontou na época a existência de 70 mil crianças em situação de rua em todo o Brasil, sendo 1800 só em São Paulo, predominantemente nos bairros centrais.
Em um questionário realizado pela ONG Visão Mundial com 586 crianças e adolescentes com idades entre 3 e 17 anos, as respostas passam longe do que estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): 19% dos entrevistados revelaram dormir com fome, 37% sofreram violência de algum tipo e 70% sofreram violência doméstica. Já 12% relataram realizar trabalho infantil, ao passo que 79% informaram que nunca tiveram contato com furto ou roubo.
Apesar de sempre precisarmos zelar pela nossa segurança, sobretudo em tempos de crise, essas respostas mostram que é preciso ter mais atenção e compaixão com essas pessoas e, além de fazer nossa parte, precisamos exigir das autoridades públicas que atendam a população de rua como um todo, com atenção especial à parcela de crianças e adolescentes que dela faz parte.
Para quem não tem um lar, suprir as necessidades básicas, ainda mais num país em crise, é uma batalha diária: o frio, a fome, a violência, a falta de estrutura, higiene e lazer, tudo é parte de uma grande batalha pela sobrevivência. Para muitos, são pessoas invisíveis, mas é importante lembrar que todos têm uma história e um porquê para se encontrarem nessa situação, e não cabe a nós julgar, mas sim auxiliar.
No inverno, vale ficar de olho nas campanhas de agasalho, de entrega de alimentos e produtos de higiene pessoal, e se isso ainda não ocorre no seu bairro, é um trabalho que sempre pode começar com um primeiro passo, já que muitas vezes os centros de acolhimento não dão conta da alta demanda. Precisamos deixar o preconceito de lado e agir cada vez mais, juntos em prol de um futuro melhor para todos.
*Com informações do G1, Nexo Jornal, Agência Brasil, Awure e Portal R7.
