A pandemia da Covid-19 trouxe muitas mudanças para a vida de todos. Infelizmente, os efeitos nocivos da pandemia vão muito além da doença propriamente dita, com inúmeros reflexos para a vida em sociedade, e as crianças e adolescentes não são poupadas. Já falamos por aqui sobre os órfãos da pandemia, mas o isolamento social que ela impôs trouxe outro problema: a violência doméstica, justamente no local onde a criança e o adolescente deveriam se sentir mais seguros e protegidos.

Violência em números

No Brasil, o canal de denúncias de violação aos direitos humanos (o Disque 100) registrou, até maio de 2021, 25,7 mil denúncias de violência física e 25,6 mil de violência psicológica. Dessas ocorrências, 59,6% do total ou aproximadamente 35 mil casos ocorreram contra crianças e adolescentes, numa clara violação aos direitos dessa parcela tão frágil da população.

A pandemia aumentou a quantidade de denúncias de atos violentos junto aos Conselhos Tutelares em 50%. De acordo com um levantamento realizado pela Fundação para a Infância e Adolescência, do Rio de Janeiro, a maioria das vítimas é do sexo feminino, correspondendo a 62% dos casos, e a faixa etária mais afetada é a de 0 a 6 anos, representando 58% do total.

Um dos tipos de violência que traz dados mais alarmantes é o abuso sexual. Segundo dados informados pelo Departamento de Polícia Judiciária da Macro-Região (Demacro) à PUC-SP, as ocorrências de abuso sexual e violência contra jovens no Estado de São Paulo tiveram queda de 70% em abril de 2020, em comparação ao ano anterior.

Porém isso não significa uma queda de fato nas ocorrências, mas sim uma subnotificação devido ao distanciamento social, que priva o contato das crianças e adolescentes com sua rede de convivência, como escola, médicos, vizinhos, demais familiares e grupos de amigos, o que dificulta que os casos sejam percebidos, descobertos e denunciados.

Pesquisas indicam que a violência contra crianças e adolescentes aumentou no período da pandemia. Mas justamente por isso, há uma subnotificação devido ao distanciamento social.

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Pandemia aumentou a quantidade de denúncias de atos violentos junto aos Conselhos Tutelares em 50%

Como combater?

Estudo realizado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Instituto Sou da Paz e o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) mostrou que o fechamento das escolas foi um dos principais fatores para a diminuição do número de denúncias, pois os professores conseguem identificar, por exemplo, indícios físicos e mudanças de comportamento nos alunos que sofreram violência, e assim a escola é capaz de tomar providências.

Sem a escola, as denúncias aconteceram até agora em canais com o Disque 100, locais de atendimentos de saúde e conselhos tutelares. E nestes, a notificação normalmente acontece quando a situação já é bem grave.

Todos nós enquanto sociedade temos como dever ficar atentos à proteção de nossas crianças e adolescentes. E em caso de suspeita, a notificação deve ser feita obrigatoriamente – não é preciso ter certeza para denunciar. Cabe aos órgãos competentes a apuração e investigação dos fatos.

Falando em ambiente, temos que estar vigilantes também no acesso à internet. Durante a pandemia houve um aumento da exploração sexual através das redes sociais e jogos online, por isso devemos ficar atentos ao tipo de informação e plataforma que a criança está acessando e com quem ela está interagindo. E tem mais: assim como ocorre com o bullying “presencial”, o cyberbullying também é um tipo de violência que não deve ser negligenciada.

Outro problema já conhecido, mas que ganhou força na pandemia, é a alienação parental, que ocorre quando um dos responsáveis pela criança a manipula contra o outro responsável direto, desqualificando-o, a exemplo de casais que se separaram de forma turbulenta e têm um relacionamento ruim. O isolamento imposto pelo novo Coronavírus dificultou as visitas de pais divorciados a seus filhos, contribuindo para que o problema se intensificasse.

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Alienação parental é um dos problemas que se intensificaram a devido ao isolamento imposto pela pandemia.

Denuncie!

Entre as políticas implantadas para o combate à violência infantil está a Lei Menino Bernardo, que foi sancionada em 2014 e proíbe o uso de punições e castigos físicos como forma de correção. O caso recente do menino Henry Borel também levou à elaboração de uma lei que prioriza a investigação de crimes relacionados ao público infanto-juvenil no Rio de Janeiro. Em São Paulo, recentemente também foi aprovada uma lei que obriga o síndico a fazer denúncia de violência doméstica, caso tenha alguma suspeita.

Lembrando que o Disque 100 é o principal meio para registro de ocorrências de violência contra a criança e o adolescente. Além do número de telefone 100, a denúncia também pode ser realizada pela internet, pelos aplicativos “Proteja Brasil” e “Direitos Humanos Brasil”, que encaminham a denúncia para a mesma ouvidoria do Disque 100. O serviço também ampara mulheres, idosos, deficientes e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Para falar com a Polícia Militar, basta discar 190.

Como proteger as crianças na pandemia

 – Crie um ambiente de paciência, apoio, carinho e segurança, interagindo com a criança e fortalecendo a relação com ela;

 – Cuide de sua saúde mental para não fazer mal aos pequenos, não descontar o estresse adulto nas crianças, que por sua vez já estão lidando com os próprios sentimentos;

– Se há alguma suspeita de que a criança esteja sofrendo algum tipo de violência por parte de outro adulto, demonstre a ela que você está ali para ajudar e que ela pode confiar em você, auxiliando-a para realizar a denúncia aos locais competentes, como por exemplo o Conselho Tutelar da sua região;

– Compartilhe essas informações para que elas cheguem ao maior número de pessoas possíveis, e assim possamos criar mais uma rede de proteção e conscientização em prol de toda criança e adolescente.

*Com informações da PUC-SP, USP, Prefeitura do Rio de Janeiro e Unicef.

 

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