No mundo todo, mais de 5 milhões de crianças e adolescentes perderam um de seus pais para o coronavírus, segundo estimativa de um estudo realizado pelo Imperial College de Londres. No Brasil, até alguns meses atrás, vínhamos tendo um novo órfão da Covid a cada 5 minutos, mas os números não são confiáveis justamente por conta da imprecisão de dados oficiais.

Devido a essa falta de dados, os órfãos da pandemia são considerados vítimas invisíveis e os números ainda não impactaram os dados do Sistema Nacional de Acolhimento  porque muitas crianças que perderam seus pais passaram a viver com familiares próximos.

A ferramenta desenvolvida pelo Imperial College mostra que 168.500 crianças perderam o pai ou a mãe no Brasil, desde o início da pandemia até o dia 12 de outubro. Se forem considerados os avós que possuíam a guarda dessas crianças, o número aumenta para 194.200 pessoas. Já dados disponibilizados pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), 12.211 crianças de até seis anos de idade ficaram órfãs no Brasil entre março de 2020 e setembro de 2021, com os estados de São Paulo, Goiás, Rio de Janeiro, Ceará e Paraná liderando a lista.

A perda de um ente familiar direto, como pai, mãe ou cuidadores da família extensa têm claro impacto emocional, social e financeiro na vida dos filhos. Devido aos protocolos de isolamento da pandemia, muitas crianças não tiveram como se despedir corretamente de seus pais, e isso prejudica a elaboração do luto, e consequentemente a saúde mental. Para quem fica, há ainda todo o estresse da readaptação à nova realidade junto a seus novos cuidadores.

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Perda de ente familiar direto gera impactos para a criança em diversos campos.

 

Além da óbvia carência de estrutura, referência e apoio que essas perdas tão dolorosas causam, perder um pai ou uma mãe também pode afetar a renda familiar e consequentemente as condições de saúde e alimentação, especialmente nas famílias mais pobres.

A pesquisadora de doenças infecciosas do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), Susan Hillis, que liderou um estudo sobre os números de órfãos da pandemia, relatou em entrevista à BBC suas impressões: “ficamos tão chocados com o número de mortes entre adultos e com a necessidade de combatê-las que nos esquecemos o quanto isso também afeta diretamente a vida das crianças.”

“Se você parar agora e contar até 12, é o tempo que basta para haver um novo órfão por covid-19 no mundo” (dados de julho 2021).

A pesquisa de Susan descobriu que, em pouco mais de um ano de pandemia, cada 3 milhões de mortes devido ao coronavírus deixaram mais de 1 milhão e meio de crianças sem mãe, pai ou cuidador primário. Ou seja, a cada dois adultos que morreram devido à pandemia, uma criança foi afetada diretamente.

Mas quais medidas devemos tomar, enquanto sociedade, para amenizar os impactos dessa trágica situação?

Ações em conjunto

É preciso aproveitar para fortalecer o relacionamento dessas crianças e adolescentes com seus parentes, seja os que moram perto, seja os que vivem mais afastados, através de vídeochamadas, por exemplo. Isso fortalece tanto os laços quanto a rede de cuidado e acolhimento que será percebida por essa criança. Se não houver alternativa junto à família, devemos proporcionar a essa criança um lar seguro e amoroso, onde ela sinta se sinta acolhida e com estrutura adequada. Em condições ideais, o acolhimento deve se estender às escolas, ao hospital que a criança frequenta, a psicólogos e profissionais especializados.

 A proteção social a essas crianças e adolescentes é essencial. Como elas irão crescer e se desenvolver sem a mãe ou o pai, é fundamental que não corram riscos como maior exposição à violência sexual, emocional e física, além de outras vulnerabilidades, como por exemplo a interrupção dos estudos, que pode impactar diretamente no seu futuro.

Quanto ao suporte financeiro, no Brasil tramitam projetos tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados que instituem programas de distribuição de renda, na forma de pensões, para os órfãos da covid-19, com valores que vão desde meio salário mínimo até R$ 1.500,00. Esses projetos devem ser unificados, de acordo com o recente relatório da CPI da pandemia.

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Órfãos da pandemia: sociedade tem o papel de acolher e prestar suporte, trabalhando em conjunto.

Mães que acolhem

Um dos belos exemplos de como podemos trabalhar em conjunto pela visibilidade e pelo bem das crianças e adolescentes que se tornaram órfãos durante a pandemia é o projeto “Mães que Acolhem”. Moradoras da cidade de Jundiaí, em São Paulo, tomaram a iniciativa que visa acolher emocional e psicologicamente crianças e jovens de até 21 anos moradores da cidade que perderam seus pais devido à covid-19. Inicialmente, o projeto foi idealizado para auxiliar um jovem de 20 anos e seu irmão, que perderam o pai, a mãe e o avô para a doença em menos de 15 dias.

Eles receberam a ajuda de três mães, que criaram um grupo no Whatsapp. Infelizmente, o número de mortes na cidade foi crescendo, e com mais jovens necessitando de apoio, o projeto cresceu e hoje atende 14 jovens, tendo 8 pessoas na coordenação e mais de 300 envolvidos, acompanhando e ajudando nas ações, além de contar com profissionais voluntários de diversas áreas, como advogados, psicólogos, fisioterapeutas, médicos, entre outros. Acompanhe o Mães que Acolhem no Instagram.

*Com informações da BBC, G1 e El País.

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